“Mutirão não é só físico, acontece intelectualmente também”, defende Lua, GSA 2022

“O mutirão não é só algo físico. Ele acontece intelectualmente, também. É quando a gente junta as nossas ideias com o que as outras pessoas já pensaram ou fizeram”, é o que defende Julie Lua a certa altura de uma conversa sobre o seu Colorindo a Quebrada com Poesia.  Seu não, ela reforça algumas vezes: nosso.

“Foi o saber e o fazer junto, esse projeto é muito sobre isso. Foi colocar as diversidades que somos para construir algo coletivo. Se as pessoas não se envolvem, não compram a ideia, as coisas não acontecem”.  

Crédito: Juliana Gomide

Lua foi uma das oito pessoas apoiadas pelo Jovens Ideias, edital do Instituto Elos que estimula quem passa pelo Programa GSA a prototipar e testar hipóteses de transformação pelo país. No caso dela, tudo começou com uma inquietação, que virou uma ideia, que virou um projeto; mudou um pouco, logo nos primeiros encontros: estar disponível ao que se apresenta como necessidade.

“Quando escrevi a proposta, queria apoiar jovens escritoras, quem estava começando a publicar seu primeiro livro. Depois percebi que muita gente que estava na caminhada há algum tempo tinha poucas oportunidades de publicação. Não eram só os alunos, mas quem facilitaria as oficinas também precisaria ser publicado”, detalha.

E foi aí que nasceu a Antologia Poética “Colorindo a Quebrada com Poesia”, reunião dos trabalhos de 15 artistas da palavra e da imagem. O lançamento aconteceu com um sarau no Espaços Elos, em 23 de agosto.

Crédito: Clarissa Borges

“Permite que eu fale, não as minhas cicatrizes”

Para costurar tantos linguagens e talentos, tantas subjetividades e agendas, Lua imaginou que era preciso antes de tudo aproximar a Filosofia Elos, uma de suas inspirações no desenho do projeto, da sua periferia, da sua quebrada. E isso começou pela linguagem. Organizou então, assim, encontros que colocavam as vivências, as memórias de alunas, alunos e oficineiros no centro da roda ora presencial, ora virtual: cada conversa, um passo.

E foi assim que os setes passos foram traduzidos para o quebradês. E foi assim que o Cuidado, por exemplo, virou Mantém o Respeito, na facilitação do Arquimedes Machado. Lua explica melhor:

“Você pode escrever sobre tudo que quiser, mas não pode ser violento com a existência de alguém. Não pode ser machista, não pode ser transfóbico, não pode ser racista. Por isso essa oficina se chamou Mantém o Respeito, que é o Cuidado”. Nesse momento, também, olha-se para todos os detalhes para a publicação de um livro: tamanho de fonte, cor, qual papel. Viu: Cuidado.

 A cada novo encontro, Pega a Visão que é o Olhar; Várias Fitas que é o Afeto, e por aí foi, uma nova pessoa artista facilitadora. E a cada nova pessoa artista facilitadora, um novo espaço seguro, convidativo e estimulante para a criação de quem sempre esteve historicamente afastada dos espaços de oportunidades. Mas, que agora, não mais.

“Nossa vida não pode ser resumida às nossas dores, é importante encontrarmos um lugar para o nosso direito ao amor também, às liberdades dos nossos corpos”, diz Lua. Para a poeta, escritora e sonhadora literária, a luta pelo direito à palavra é, também, uma luta pelo direito à existência histórica.

“Nossa memória, como povo preto, passa muito pela oralidade. Então, a gente precisa agora registrar também no papel as nossas Escrevivências, como diz a Conceição Evaristo”. 

E Lua se atentou aos dois jeitos de caminhar: quem quiser escutar o audiobook do Colorindo a Quebrada com Poesia é só clicar aqui.

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